quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A essa altura, não dá pra ficar de fora do hype que envolve GRAVIDADE ao redor do mundo: o filme que recebeu as melhores e mais empolgantes criticas se confirma diante de um público que assiste angustiado a saga da astronauta Ryan Stone, que após um acidente espacial vaga pelo espaço em busca de qualquer porto-seguro. É um filme estupendo, praticamente irretocável, e não é difícil de imaginar que em muito pouco tempo passará a figurar na lista dos grandes títulos que já fazem parte da história do cinema e da arte.

Da mesma forma que também seja bastante pouco provável que qualquer análise dê fim às multiplicas questões inerentes à complexidade temática e complexidade de imagens que o filme dirigido pelo mexicano Alfonso Cuarón propõe. Sinteticamente, ao lançar a protagonista - vivida por uma impressionante Sandra Bullock – no vazio do espaço, a 600km de distância do nosso planeta, em condições muito particulares do ambiente ao redor, o diretor propõe uma espécie de “minimização do conjunto cenográfico” para ampliar a dramatização dos dilemas existenciais da personagem, que de certa forma ressoa no espectador que, angustiado, assiste a tentativa de sobrevivência da mulher (e, afinal de contas, o que fazemos todos os dias, mesmo na segurança da poltrona e de frente à TV, senão nos mantermos vivos?). Pungente e visceral, GRAVIDADE não deixa saídas e flerta com o espectador de todas as formas possíveis e no tom exato – fazendo uma brincadeira com outra arte, não dá pra sair do cinema acreditando na veemência da cabal “Menos é Mais” que Mies Van Der Rohe, um dos cânones da arquitetura mundial, sugeriu como forma de ampliar o sentido da coisa em uma forma, digamos, menos ‘arrojada’, mais ‘limpa’. Os mais interessados pelo processo de execução, certamente vão se perguntar como Cuarón lida com os inúmeros artefatos de filmar (imagens apaixonantes do espaço, máquinas e estações espaciais ultra-tecnológicas, e personagens que bailam no ar) e ainda encontra o tom absurdamente humano de sua história.

Gravidade

Mas mais que tudo isso (me parece ser uma suposição possível e justificável neste momento), o que transfere à GRAVIDADE o status de poder figurar num hall de grandes filmes de história, é justamente uma possível conexão que ele estabelece com outro exemplar de referência histórica: 2001, UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO, de Stanley Kubrick. Certamente um dos filmes mais enigmáticos já feitos, o clássico de 1968 encerrava com um dos planos mais reconhecidos no cinema e, provavelmente, um cujo sentido seja o menos óbvio que possa parecer: o bebê envolto na "placenta". Além das claras motivações da astronauta Ryan Stone (não há como citar alguns spoilers a partir daqui), cuja vida ganhou/perdeu contornos com vida/morte de sua filhinha, Cuarón permeia o filme de pequenos e grandes símbolos a essa fase da vida (a brincadeira com os latidos de cachorro, típica de criança; o bebê que o chinês cuida enquanto Ryan tenta estabelecer contato – que não por acaso vem do local mais populoso da Terra) e na transcrição do ciclo da posição fetal que Sandra Bullock permanece ao adentrar, pela primeira vez, em um ambiente seguro após os inúmeros incidentes na evasão do espaço. Um daqueles filmes gradiosos que o cinema produz.


GRAVIDADE
(Gravity, EUA/2013, de Alfonso Cuarón)
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