sábado, 31 de maio de 2014


MALÉVOLA é um produto Disney que cumpre quase sempre o prometido. É divertido sem exagerar nas histrionices, com algumas boas sequencias cheias de efeitos visuais atrativos e Angelina Jolie se esbaldando no papel da fada malvada abusando das caras, bocas e viradinhas de pescoço dignas de uma cantora pop alçada ao plano de “diva” (para delírio da crescente plateia que se manifesta dentro do cinema com interjeições e aplausos). Interessante mesmo é perceber que a grande aposta do filme é também seu maior risco: para recontar a história do conto “A Bela Adormecida” sob o ponto de vista da vilã, o estúdio investe no mesmo caminho do sucesso FROZEN, que ganhou o último Oscar de animação. A antagonista da Bela (interpretada com excessos de sorrisos pela atriz Elle Fanning) passa por uma transformação em sua personalidade, deixando-a mais próxima da condição humana – aquela que cai em desgraça e comete maldades, mas também é cheia de virtudes e boas intenções –, como a rainha Elsa. A ousadia que modifica a trama do filme inevitavelmente acaba por modificar partes do conto original, dando ao filme seu maior atrativo: romper limites, propor mudanças, ousar sobre o que já foi dito, fugir da representação literal. É muito, muito bacana quando um filme corre risco e foge da segurança das representações repetitivas e banais (ainda que o público mais ortodoxo esbraveje ao final da sessão – como aconteceu com o recente NOÉ, quando a plateia saía do cinema acusando o diretor Darren Aronofsky de heresia por conta das mudanças promovidas na história do profeta bíblico). 

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Para ver: MALÉVOLA (Maleficent, 2014, de Robert Stromberg). Com Angelina Jolie, Elle Fanning, Sharlto Copley, Lesley Manville, Imelda Staunton, Juno Temple, Sam Riley.
Cotação: 


segunda-feira, 26 de maio de 2014

Em REFÉM DA PAIXÃO o diretor e roteirista Jason Reitman abandona o cinismo e ironia de JUNO e JOVENS ADULTOS para realizar um excelente drama romântico e melancólico sobre Adele (Kate Winslet), uma dona de casa que foi abandonada pelo marido e vive com o filho adolescente, Henry, em um subúrbio americano. Certo dia, suas vidas pacatas se cruzam com a de um fugitivo da polícia, Frank (Josh Brolin), que se esconde na casa da família. Da aproximação entre o bandido e a mocinha depressiva nasce um relacionamento, a princípio tenso e ilegal, que transforma a vida de ambos, conduzido com extrema destreza e paixão por Reitman – que retoma o passado dos personagens para solidificar as situações do presente. Sensível e doce, mesmo se equilibrando em uma linha moral muito tênue, Reitman introduz uma narração que se propõe olhar para esse universo de fora pra dentro, mas sem abandonar os detalhes do que acontece dentro da casa – é o filho, já adulto (na voz de Tobey Maguire) que relembra em tom saudosista o final-de-semana em que ele e Adele estiveram sob a tutela de Frank. A maturidade da construção lembra bastante os caminhos que o diretor já percorreu com o também sensível e sóbrio, ainda que apaixonante, AMOR SEM ESCALAS, de 2009. Grande trabalho também de Kate Winslet, atuando entre a amargura e os pequenos sopros de vida que sua personagem recebe.

Para ver: REFÉM DA PAIXÃO (Labor Day 2013, de Jason Reitman). Com Kate Winslet, Josh Brolin, Gattlin Griffith, Tobey Maguire, Tom Lipinski, J.K. Simmons, James Van Der Beek.
Cotação:


O conteúdo da edição 2014 do FESTIVAL DE CANNES, que consagrou o turco WINTER SLEEP com a Palma de Ouro, já está disponível na página especial do festival. Relembre aqui o dia a dia de exibição de cada um dos concorrentes.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Hoje, 12 de maio, faz 20 anos que PULP FICTION, de Quentin Tarantino, foi exibido pela primeira vez, no Festival de Cannes de 1994.

sábado, 10 de maio de 2014


A edição nº 75 do maior festival de cinema do mundo, o FESTIVAL DE CANNES, começa na próxima quarta-feira, dia 14 de maio. Já assistiu a todos os filmes que fizeram parte da edição de 2013? Relembre aqui cada um dos concorrentes.

quarta-feira, 7 de maio de 2014


Há quem torça o nariz para o cinema de armadilhas e artimanhas que o canadense Dennis Villeneuve faz. E depois da bem sucedida incursão no thriller hollywoodiano OS SUSPEITOS, no ano passado, em seu novo filme, O HOMEM DUPLICADO, o diretor volta a tocar na mesma construção de REDEMOINHO, sua estreia nos cinemas em 2000, vencedor de oito prêmios no Genie Awards daquele ano e da Mostra Panorama do Festival de Berlim. A história, que é baseada na obra homônima do escritor português José Saramago, apresenta como protagonista Adam, um professor universitário que certo dia assiste a um filme no conforto do sofá de casa e vê-se em cena, em segundo plano. A partir de então, começa a investigar o significado daquilo, atrás das respostas mais imediatas (um irmão gêmeo que nunca lhe foi anunciado ou a existência de um duplo/clone em algum lugar do mundo).

Extrapolando em muito a estranheza do universo visual criado em sua estreia, Villeneuve propõe um filme bastante enxuto, guiado por simbologias intrigantes e enigmáticas (a aranha que estampa o pôster, presente em diversos segmentos do filme, possivelmente é a mais emblemática delas), com diálogos e fatos que nunca merecem ser descartados e que se conectam com alguma outra sequência apresentada em seus 90 minutos de duração. O HOMEM DUPLICADO é um daqueles exemplares cinematográficos cuja primeira análise não dá cabo de todas as intenções almejadas: é preciso ruminar cada acontecimento como forma de montar o quebra-cabeça proposto pelo diretor. É um modo fascinantemente interessante de se fazer cinema (que se esgota numa segunda ou terceira olhada e a partir de então merece ficar na memória). O caminho percorrido pelo protagonista vivido por Jake Gyllenhaal até desvendar a existência de Anthony, seu duplo, tem suas ações e falas tão minuciosamente pensadas que chega a ser perturbador em quase todas as cenas – não é raro que o espectador se pergunte várias vezes que tipo de história está acompanhando – acrescido pelo fato de que, como a protagonista de Marie-Josée Croze de REDEMOINHO, Adam (o Tertuliano Máximo Afonso de Saramago) vive uma vida soturna e cíclica, que jamais parece despertar qualquer interesse dele mesmo – ainda que tenha uma boa profissão (que ele faz questão de conduzir com absoluta desmotivação), um belo apartamento (cuja ambientação é o reflexo de sua vida depressiva e desinteressante) e uma namorada belíssima (vivida pela francesa Melànie Laurent) com quem mantém boas noites de sexo.

O ótimo roteiro de Javier Gullón passa longe do didatismo, mesmo com seu autor afirmando ter modificado seções da trama original de Saramago. Para o filme, a complexa jornada de Adam teria, na verdade, um forte caráter subjetivo, distante de respostas fáceis que a existência de um homem duplo pode indicar. Para o cinema, O HOMEM DUPLICADO é Dennis Villeneuve percorrendo os caminhos que David Lynch fez em MULHOLLAND DRIVE – com menos camadas e brilhantismo, mas entregando um filme incrível.



SPOILER
(revelações importantes sobre o conteúdo do filme, não recomendável para quem ainda não o assistiu)


Apesar da trama suscitar diferentes explicações sobre seu conteúdo, a que me ocorre com maior clareza é que Anthony, o ator, é um produto do subconsciente de Adam, o professor. Como se ele estivesse num surto de dupla personalidade, em decorrência da vida insossa que leva com sua esposa, Helen (vivida pela atriz Sarah Gadon), que está grávida, após obrigá-lo a terminar seu caso extraconjugal com Mary (personagem de Melànie Laurent). Três eixos parecem capazes de sustentar essa ideia (ainda que muitas outras coisas corroborem para tal):

Helen, a esposa. Grávida, ela fica transtornada sempre que percebe a crise mental do marido (quando fala com ele ao telefone ou no apartamento, quando vai à universidade vê-lo) e sugere em uma conversa que desconfia que ele voltou a traí-la. Ela está grávida de 6 meses, mesmo tempo em que Anthony não vai até o prédio da agência de sua “carreira” no cinema, que pode ser o local em que ele se encontrava com a amante. Ela percebe a insanidade mental do marido e, nos diálogos, insiste que ele sabe o que está acontecendo.  

Mary, a amante. Adam sempre teve traços de infidelidade – frequentava clubes de strip-tease no passado, e chega a ser questionado por sua mãe quanto a sua instabilidade – e manteve um relacionamento com Mary em um apartamento que utilizavam para se encontrar, possivelmente sem ela saber que ele era casado (ele sempre tirava a aliança?). Ao se ver encurralado pela esposa por conta de sua sanidade mental, ele dá um jeito de eliminar a amante do seu caminho – em um plano psicológico, uma vez que ao que parece todos os acontecimentos do presentes são apenas fruto da imaginação de Adam. Mary já não é a amante há pelo menos seis meses (tempo para surgir uma marca de aliança no dedo, que ela estranha).

A aranha. O elemento que denota a loucura de Adam pode representar o ponto chave da trama: o aprisionamento a um relacionamento estável com sua esposa. A aranha aparece pela primeira vez na cena do clube de strip-tease, em que uma stripper solta o bicho sobre o palco rodeado de homens para logo depois pisar sobre ela, o que parece uma metáfora bem clara do desprestígio ao casamento ou, ainda, "pisar sobre a própria esposa". Ao avançar a trama, a aranha aparece outras duas vezes: primeiro sobre a cabeça de uma mulher sensual que caminha pelo teto de um corredor escuro em um sonho de Adam (outra metáfora para a infidelidade, a mulher que “vira a cabeça” do homem); e em seguida, sobre os edifícios da cidade (sinal da opressão do ser sociável?). Na cena do acidente de carro, após o capotamento, o vidro lateral do banco em que estava Mary, a amante, tem um trincado em forma de teia de aranha (a esposa teria, definitivamente, vitimado a amante e capturado o marido?). Por fim, após a aparente ordem mental de Adam ter sido restabelecida, na cena final, tem-se a maior estranheza, quando ele vê que a mulher se tornou uma aranha gigantesca dentro do quarto do casal, dominando cada pedaço do cômodo. Sugestivo, não?


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Para ver: O HOMEM DUPLICADO (Enemy, 2013, de Dennis Villeneuve). Com Jake Gyllenhall, Melànie Laurent, Sarah Gadon, Isabela Rossellini.
Cotação:

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Woody Allen, cujo filme de 2014 - MAGIC IN THE MOONLIGHT - está previsto para estrear em Julho nos Estados Unidos, já começa a preparar o filme de 2015: Joaquin Phoenix estará no elenco.

DEAR MR. WATTERSON, documentário sobre o criador dos personagens Calvin e Haroldo, Bill Watterson, se concentra em revelar o universo de autor, mostrando suas referências, explicando suas predileções e posturas e, também, revelando os principais acontecimentos de sua carreira, dos anos 80 para cá. À medida que o diretor do documentário, Joel Allen Schroedersai em busca de Bill (que evita a todo custo qualquer exibição pública), mostrando sua cidade, infância e primeiros trabalhos, como forma de adentrar no universo de criação do autor, algumas das melhores histórias de "Calvin e Haroldo" são reveladas ao espectador - inclusive em uma visita ao acervo público que detém todas as publicações originais de Bill. Na maior parte do tempo, a discussão se debruça sobre o fato de "Calvin e Haroldo" nunca ter sido comercializado em nenhum outro produto ou arte que não a própria tirinha (exigência de seu idealizador). O filme talvez não caia nas graças de quem não se derrame pelos encantos ou seja fã do universo do moleque e de seu tigre de pelúcia - como eu -, mas deve interessar aos que gostam de adentrar no processo de criação de um grande autor.

Para ver: DEAR MR. WATTERSON  (idem, 2013, de Joel Allen Schroeder). 
Cotação: